Café de Flore - Paris

segunda-feira, 9 de setembro de 2019

Portugal - Das tabernas aos cafés.

" Venda de café  em Lisboa.

Foi apenas no início do século  XVIII
 que chegaram ao nosso país as influências francesas no que diz respeito a novas formas e locais de sociabilidade,  embora entre nós o convívio em  locais  públicos  sempre  tenha  passado  pela  interação  entre  diferentes  classes  sociais. Em botequins,  tabernas ou tabolagens  bebia-se muito álcool,  discutia-se,  lutava--se,  tocava-se e,  sobretudo,  jogava-se.  Nesses antros,  a paixão pelo jogo – qualquer tipo de jogo – juntava desde marginais a nobres,  apesar de a lei ser bem clara no Regimento dos Taberneiros de 1797: «Nenhum taberneiro consentirá nas suas tabernas qualidade alguma de jogo às pessoas que a elas forem comer; e muito menos aos criados de servir e escravos.»19 Consta ainda deste regimento a proibição de «ajuntamentos de mulheres dos quais possam resultar as desordens que são próprias de quem frequenta similares casas».  Da redação deste  regimento  infere-se que  o  ambiente  das tabernas  e  tavolagens, ou  tabolagens, deixava bastante a desejar,  sendo frequentes as rixas que começavam dentro e extravasavam para a rua. Os cafés,  enquanto espaços  públicos das novas formas de sociabilização,  chegaram a Portugal mais tarde do que à maioria dos países europeus,  sobretudo no que diz respeito ao ambiente de trocas intelectuais que os caracterizavam em França ou em Inglaterra. Tinop desconsidera os primeiros estabelecimentos,  afirmando que «entre nós,  os cafés têm sido apenas umas vezes a cópia grotesca,  caricatural, outras vezes a fotografia pessimamente retocada dos lá de Portugal From taverns to cafés Por altura do aparecimento dos primeiros cafés em Portugal, estava ultrapassada a moda do orientalismo no resto da Europa, e o  negócio  concentrava-se na  mão dos  italianos. As limonadas e a «neve» eram as maiores atrações dos cafés e, ao contrário de França ou de Inglaterra,  bebia-se bastante chá até aos finais do século  xviii.  Até sob o ponto de vista literário,  poucas são as referências ao café-bebida. Uma das épocas áureas da vida dos nossos cafés foram os anos  das  guerras  liberais,  os que  as  precederam e  se  lhe seguiram,  e ainda os anos de viragem do século  xix  para o século  xx,  com o fim da Monarquia e a implantação da República.  Segue-se uma história abreviada dos principais estabelecimentos dos séculos  xviii  e  xix.  Tabolagem «É tomado do castelhano  tablaje,  que é casa de jogo. Na ordenação chamam-se tabolagens às casas de jogos proibidos.  Dar tabolagem é dar em sua casa naipes,  dados e outras coisas concernentes ao jogo. [...] El-rei D.  João II mandou queimar a casa  de tabolagem,  qual pagode,  aonde em semelhanças de idolatria se viram obedecidos e festejados por oráculos da sorte,  por efígies da Fortuna...» Padre Rafael Bluteau, fora»20,  em  parte  devido  à  apertada  censura  da  Real  Mesa Censória e ao zelo da Intendência-geral da Polícia. Quando os cafés finalmente  chegaram gerou-se alguma confusão com o conceito de botequim.  Este,  segundo o Dicionário de História de Portugal,  é uma loja onde se servem vários tipos de bebidas21.  A sua raiz será a mesma da  bodega  espanhola  e  terá  dado  origem  ao  boteco  brasileiro,  locais onde se consomem bebidas alcoólicas e comidas.  Assim foram também os cafés entre nós: além de chá e café,  sempre neles  se  serviu  álcool  «fino»,  deixando  para  as  tabernas o tradicional vinho barato a copo.  Os primeiros botequins de  Lisboa  terão  sido  as  casas  Rosa  e  Madama  Spencer,  ambas na antiga Rua Nova (Rua dos Capelistas) e anteriores ao Terramoto.  A maior concentração destes estabelecimentos situava-se no Largo do Regedor e em São Roque."

Fátima Moura
Obra: Conversas de Café

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