Café de Flore - Paris

quarta-feira, 14 de agosto de 2019

O café do triângulo


Histórias há muitas  com café e em cafés, muitas haverá. A minha é pessoal e transmissível, porventura comum a muitos portugueses.

Desde pequena, ao colo e depois pela mão do meu pai, que ir ao café era um momento bom: os cheiros do café a ser moído, juntamente com o do tabaco de cachimbo, da aguardente velhíssima, do pão acabado de sair do forno, dos pastéis e do papel de jornal e, com alguma sorte, de um chocolate que me era dado, perduram até hoje na minha colecção de memórias boas. Ir ao café era, para mim, ir ao Café Anadia, bem no centro da praça do município com o mesmo nome. Ponto de encontro dos homens que jogavam às cartas ou às damas e conversavam de futebol ou de temas graves e sérios que eu não entendia, das senhoras que falavam de modas e cantores, da última novidade da televisão ou teciam histórias com personagens da terra. Era onde se registava o Totobola e se comprava a Lotaria. Era onde se sabia da vida que acontecia nos meandros da vila e arredores…

E o café era o do triângulo. Eu ainda não sabia o que eram triângulos, mas a imagem ficou gravada na minha cabeça como o símbolo de café, bom café, que eu sempre quis provar, roubando à socapa a colherinha para aproveitar o restinho de açúcar acafezado do fundo da chávena, até me deixarem beber um café a sério. Ainda hoje, se passo numa rua e sinto o aroma reconfortante, procuro o triângulo. É Delta? Sinto-me convidada a entrar, sentar e apreciar as vidas de cada mesa, de cada banco do balcão, enquanto faço render o tempo precioso que dura a pausa deliciosa da rotação da colher na chávena do meu Delta.

E é como se voltasse ao Café Anadia, ao colo do meu pai, no tempo em que os aromas, as imagens, os sons e as pessoas deixavam uma marca especial na nossa alma.

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